04 _Mitos sobre o suicídio
Temos que mudar a cultura de silêncio que existe em torno deste tema, e fazer com que seja natural falar de saúde mental e de suicídio.
Os mitos perpetuam o estigma.
Os mitos marginalizam os outros.
Os mitos são um obstáculo aos gestos de ajuda.
Não só é correto como é imperativo falar sobre saúde mental e suicídio.
MITO: Fazer perguntas sobre o suicídio vai incutir a ideia na cabeça da pessoa.
INFO: Não existem provas para este facto. A maioria das pessoas que pensa em suicídio, sente alívio ao falar sobre o assunto. Falar sobre métodos específicos de suicídio, isso sim, aumenta o risco. No entanto, não há problema em perguntar se já pensaram num método.
MITO: As pessoas que falam sobre o suicídio, têm menor probabilidade de vir a cometê-lo.
INFO: A maioria das pessoas que se suicida manifesta de alguma forma a sua intenção.
MITO: Se alguém quiser realmente suicidar-se, não há nada que se possa fazer.
INFO: A maioria dos casos de ideação suicida está ligada a doenças subjacentes tratáveis ou a fatores presentes de stress. O período de risco imediato de suicídio é, muitas vezes, limitado no tempo. Por isso, se puder ajudar a pessoa a adiar os seus planos, estará a contribuir significativamente para a sua segurança. A investigação mostra que a psicoterapia, a medicação e o apoio da comunidade são eficazes para melhorar o estado mental de alguém que está a considerar suicidar-se.
MITO: As múltiplas automutilações e tentativas de suicídio, são tentativas de chamar a atenção e não são realmente comportamentos suicidas.
INFO: As múltiplas tentativas prévias e as automutilações, aumentam a probabilidade de uma morte por suicídio.
A automutilação é mais prevalente nas pessoas autistas do que na população em geral, podendo incluir comportamentos como bater em si próprio, arranhar-se ou arrancar a pele. Trata-se de um comportamento repetitivo e restritivo que pode ser uma forma de a pessoa reagir ao stress ou à ansiedade, ou uma forma de se distrair ou acalmar. Este comportamento não está, geralmente, associado a ideação suicida. As pessoas autistas podem também envolver-se noutros tipos de autoagressão, como cortar-se, o que pode indicar stress psicológico e ser um sinal de alerta para pensamentos ou comportamentos suicidas. Pode ser muito difícil distinguir entre a automutilação que está associada a um comportamento repetitivo e restritivo, e a automutilação que indica sofrimento psicológico. Esteja atento aos casos em que estes comportamentos se tornam algo fora do habitual para essa pessoa, nomeadamente quando a automutilação aumenta de frequência ou quando são utilizados novos métodos. Considere também a função do comportamento. A automutilação insere-se no contexto de um comportamento repetitivo que a pessoa teve no passado quando se sentia aborrecida ou stressada, ou parece estar relacionada com um fator de stress recente? Se não tiver a certeza, é sempre útil perguntar se a pessoa está a considerar o suicídio. Se o comportamento estiver a causar danos (quer seja no contexto de ideação suicida ou não), veja se consegue colocá-la em contacto com um psicólogo ou terapeuta ocupacional que lhe possa ensinar outros comportamentos menos nocivos para lidar com a ansiedade, o stress, o tédio, etc., como, por exemplo, ter um instrumento sensorial com o qual possa interagir.
‘Por detrás de cada comportamento há um sentimento. E debaixo de cada sentimento há uma necessidade. E quando satisfazemos essa necessidade, em vez de nos concentrarmos no comportamento, começamos a lidar com a causa e não com o sintoma.’ Ashleigh Warner.
MITO: É possível prever.
INFO: Embora esta ferramenta forneça informações sobre possíveis fatores de risco e sinais de alerta, bem como orientações sobre como agir, não é capaz de prever as ações que alguém pode tomar.
MITO: Se o meu ente querido se suicidar, a culpa é minha.
INFO:
Os pensamentos e ações de outra pessoa não são resposabilidade sua.
Os seus pensamentos e ações, estão fora do seu controlo.
Os seus pensamentos e ações resultam de uma combinação complexa de fatores biológicos, genéticos, neurológicos, de desenvolvimento, socioeconómicos, culturais, de experiência de vida, de consumo de substâncias, ambientais, de personalidade, de padrões de pensamento, comportamentais e outros.
MITO: Uma pessoa com pensamentos suicidas é um cobarde.
INFO: As dificuldades de saúde mental e os pensamentos suicidas não são sinónimo de preguiça, cobardia, procura de atenção, má alimentação, fraqueza mental, física ou espiritual, fracasso ou inutilidade. As dificuldades de saúde mental e os pensamentos suicidas representam um sofrimento psicológico e um esgotamento tão grandes que se torna difícil ver qualquer caminho a seguir.
MITO: As pessoas autistas não têm empatia pelos outros e não se preocupam com o impacto que as suas automutilações e tentativas de suicídio têm nos outros.
A maioria das pessoas autistas sente intensa e profundamente e tem uma vida interior rica. A intensidade das suas emoções pode ser uma consequência das suas diferenças cognitivas. Tal como qualquer outra pessoa, podem ter compaixão e consciência dos outros. Podem experienciar emoções intensas como uma espécie de sobrecarga sensorial, que demora tempo a processar. Sem o auxílio de uma regulação emocional, terapia ou apoio, esta situação pode levar à ideação suicida. Dizer-lhes para pensarem no impacto que o seu suicídio pode ter nos outros pode não ser a coisa mais útil, porque por vezes a sensação de inutilidade e de ser um fardo é tal, que parte da motivação para o suicídio é precisamente a de deixar de ter um impacto negativo nas pessoas à sua volta (independentemente de isso ser verdade ou não). Em vez disso, concentre-se em aliviar os fatores de stress à sua volta, como o apoio anti-bullying na escola ou no local de trabalho (ver mais exemplos nos passos seguintes). Se é pai, professor ou presta apoio a uma pessoa autista, falar sobre como é difícil apoiá-la à frente dela pode agravar a situação. Procure apoio para si próprio, sempre que possível, através de grupos de apoio ou de aconselhamento.
MITO: As pessoas autistas não são sociáveis e não querem ou não precisam de amigos.
As pessoas autistas têm frequentemente um forte desejo de ligação e de ter amigos com quem passar o tempo. Podem ter dificuldade em fazer e manter amigos devido à sua forma diferente de compreender os sinais e as expetativas sociais, especialmente no seio de grupos, o que pode levar a sentimentos de isolamento e alienação. Isto pode levar à ideação suicida. Pode ajudar, aprendendo sobre a forma como o seu comportamento autista se manifesta, apelando à tendência para sistematizar, fornecendo informações contextuais, sendo inclusivo e centrando-se nos pontos comuns e não nas diferenças. Muitas pessoas autistas podem preferir ter como amigos outros autistas, com interesses semelhantes aos seus. Pode ajudar, colocando-as em contacto com a comunidade autista. Podem também preferir actividades paralelas, em vez de actividades sociais diretas. O medo das falhas de comunicação ou de ser mal interpretado é um obstáculo às amizades. As pessoas autistas podem também ter um diálogo interno analítico forte e constante. Isto pode levar a respostas mais lentas quando comunicam com os outros. Dar-lhes tempo para processar e responder sem os apressar ou interromper pode ajudar.
MITO: Se alguém se identifica como LGBTIQA+, existe muito apoio específico disponível para essa pessoa, ela não precisa da minha ajuda.
INFO: O risco de suicídio na comunidade LGBTIQA+ é muito superior ao dos pares (em idade, situação socioeconómica, etc.) que não se incluem neste grupo. O risco não resulta da sua identidade, mas sim da discriminação, da intimidação, do bullying e de um sentimento de não pertença. Ser um aliado forte pode funcionar como um fator de proteção. Ideias para ser um bom aliado: não pressuponha a identidade sexual ou a relação/estado civil de alguém, pergunte às pessoas quais são os seus pronomes, utilize os pronomes corretos e corrija-se a si próprio e aos outros se utilizarem os pronomes errados, não faça piadas ou comentários homofóbicos, transfóbicos ou outros semelhantes, insurja-se quando ouvir este tipo de piadas, utilize uma linguagem inclusiva, aprenda o que são "micro-agressões" e trabalhe para as eliminar, informe-se sobre os problemas que esta comunidade enfrenta, seja um apoio visível e saiba mais sobre como ser um bom aliado.
MITO: O mundo progrediu e as pessoas LGBTIQA+ recebem um bom apoio nos domínios da medicina e da psicologia.
INFO: O SNS muitas vezes não consegue garantir os cuidados necessários e ainda existem muitos obstáculos. Faltam apoios acessíveis nas zonas rurais. Os serviços prestados não são, de um modo geral, satisfatórios. A maioria das pessoas LGBTIQA+ tem más experiências ao visitar médicos e profissionais de saúde mental devido à discriminação, à falta de inclusão, à falta de sensibilidade, de educação, de consciencialização, de formação e de apoio às suas necessidades.
MITO: Não há grandes diferenças nas estatísticas de suicídio entre os vários grupos da população.
INFO: As pessoas LGBTIQA+ têm uma saúde mental mais precária e apresentam taxas de suicídio mais elevadas do que os seus pares, com taxas de pensamentos suicidas até 18 vezes superiores. Estas taxas mais elevadas estão diretamente relacionadas com experiências de estigma, preconceito, discriminação e abuso com base na sua identidade de género, orientação sexual ou identidade de género não binária.
INFO: A pertença a múltiplas identidades minoritárias pode aumentar os desafios sociais e o isolamento. A isto chama-se intersecionalidade: ter duas ou mais identidades minoritárias. Uma pessoa autista e LGBTIQA+ enfrenta desafios únicos e acrescidos. Esta interseção pode significar que são rejeitadas pelos grupos LGBTIQA+ devido às suas características autistas e rejeitadas pelas comunidades autistas devido à sua orientação sexual. As pessoas autistas e LGBTIQA+ precisam de ser vistas e apoiadas enquanto pessoas completas, incluindo os seus interesses e pontos fortes.
O QUE SÃO MICROAGRESSÕES?
Comentários ou comportamentos quotidianos, intencionais ou não, que discriminam, ou têm um carácter hostil ou depreciativo em relação a grupos estigmatizados e culturalmente marginalizados, como as pessoas com deficiência, a comunidade LGBTIQA+, as pessoas racializadas e as pessoas autistas.
Exemplos de microagressões:
Microagressões contra pessoas LGBTIQA+:
És trans? Eu nunca teria adivinhado. És muito bonita para uma rapariga trans.
Qual era o teu nome antes?
Já fizeste a cirurgia?
Microagressões contra pessoas autistas:
Não pareces autista.
Toda a gente é um bocadinho autista.
És autista? Mas és tão empático!
Referir-se ao autismo como uma doença, epidemia, perturbação, deficiência, sintomas ou “sofrer de”.
Microagressões contra pais do mesmo sexo:
Referir-se ao dador de esperma como "o pai".
Perguntas como “quem é o pai?” ou “onde está a mãe?”
Perguntar “quem é que veste as calças na relação?”
Perguntar “quem é o homem/mulher na relação”?
Perguntar “quem desempenha "o papel" de homem/mulher na relação?"
Image by: https://www.itspronouncedmetrosexual.com
No original, The Genderbread Person, que é uma alusão aos Gingerbread Man, os homens-biscoito de gengibre comuns na época de Natal nos países nórdicos e nos EUA.